A vereadora Zoe Martínez (PL-SP) protocolou uma representação formal na Procuradoria-Geral da República (PGR) acusando a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) de possível ato de improbidade administrativa. A parlamentar teria utilizado verba da cota parlamentar para pagar R$ 8.700 a uma empresa de segurança privada, a Mapi Consultoria em Sistemas de Segurança e Proteção Comunitária, que, segundo ofício da Polícia Federal, não possui autorização legal para atuar no setor.
O serviço foi declarado como “segurança prestada por empresa especializada” no Portal da Transparência da Câmara dos Deputados, mas o documento oficial da PF entregue com a denúncia confirma que a empresa não tem licença ativa para operar como segurança privada.
O ponto central da acusação
Além da ausência de autorização formal da Mapi junto à PF, Zoe afirma que o endereço registrado no CNPJ da empresa, localizado no bairro do Paraíso, em São Paulo, é na verdade um espaço de coworking. Segundo a vereadora, a visita ao local mostrou nenhum indício de estrutura compatível com atividades de segurança, o que levanta dúvidas sobre a legitimidade da contratação e da própria existência funcional da empresa.
Ainda conforme relato anexado, porteiros e prestadores de serviço no local desconheciam qualquer movimentação compatível com uma empresa de segurança de atuação física constante ou estrutura funcional.
Empresas que existem no papel
O caso ganhou ainda mais contornos de suspeita quando foi identificado que a mesma empresa, a Mapi, emitiu nota fiscal no valor de R$ 9 mil para a vereadora Amanda Paschoal (PSOL). O serviço, desta vez, seria de consultoria e monitoramento de redes sociais — atividade que não condiz com a descrição principal do CNPJ da empresa. Para Zoe, esse padrão reforça a tese de que a empresa atua como fachada, emitindo notas fiscais de serviços diversos, sem devida habilitação e transparência.
A divergência entre o objeto social declarado e os serviços prestados pode configurar uso indevido de verba pública e abre espaço para a responsabilização não apenas dos contratantes, mas também da empresa.
A legislação que sustenta a denúncia
A base legal da denúncia é a Lei 8.429/1992, conhecida como Lei de Improbidade Administrativa, que pune agentes públicos que causem dano ao erário, enriqueçam ilicitamente ou violem princípios da administração, como legalidade, impessoalidade e moralidade.
No caso específico, Erika Hilton é apontada por supostamente descumprir esses princípios ao contratar uma empresa sem comprovação legal de atividade no ramo e sem documentação que justifique a execução do serviço. As sanções possíveis incluem multa, perda de mandato, suspensão dos direitos políticos e devolução integral do valor pago com verba pública.
O impacto político e a reação do público
A denúncia ocorre em meio a um momento de maior exigência por transparência e responsabilidade no uso de recursos públicos por parte da sociedade. Ainda que o valor envolvido não seja alto se comparado a grandes escândalos, o caso evidencia brechas no controle institucional sobre a cota parlamentar, usada mensalmente por todos os deputados para despesas relacionadas à atividade legislativa.
A repercussão da denúncia mobilizou redes sociais, veículos de imprensa e setores políticos, ampliando o debate sobre como pequenas irregularidades podem refletir práticas estruturais de má gestão pública.
A ausência de resposta e os próximos passos
Até a última atualização desta reportagem, Erika Hilton não havia se pronunciado oficialmente. A equipe da deputada também não apresentou documentação que comprove a legalidade da empresa ou a entrega do serviço contratado. Caberá agora à PGR avaliar se há elementos suficientes para abertura de inquérito e eventual processo judicial.
Além disso, a própria Câmara dos Deputados poderá ser provocada para fiscalizar se houve má aplicação de recursos públicos, o que pode gerar consequências administrativas internas.
O que está em jogo para o sistema democrático
Mais do que a responsabilização de uma única deputada, o caso levanta um alerta mais amplo: quem fiscaliza o uso das verbas parlamentares? Como garantir que cada centavo gasto com dinheiro público seja rastreável e justificado?
Especialistas em direito público apontam que episódios como esse evidenciam a urgência de mecanismos de fiscalização mais eficazes, com auditoria prévia e cruzamento automatizado de dados de empresas contratadas, incluindo verificação de habilitações legais antes da liberação de pagamento.
Desdobramentos possíveis e alcance institucional
Se a investigação for instaurada e confirmar as irregularidades, a PGR poderá responsabilizar não apenas Erika Hilton, mas funcionários da Câmara que aprovaram ou processaram o pagamento, além da própria empresa Mapi, por falsidade ideológica ou prestação de serviço fictícia.
O episódio poderá, ainda, impulsionar projetos de lei voltados ao fortalecimento da fiscalização das verbas parlamentares, com exigência de comprovação em tempo real da entrega dos serviços e atuação do TCU em contratos recorrentes.
Conclusão: mais do que um contrato, um sinal de alerta
O episódio protagonizado por Zoe Martínez e Erika Hilton vai além de uma disputa política entre parlamentares de campos opostos. Ele reacende um debate essencial para a democracia: o direito do cidadão de saber como o dinheiro público é gasto, e de exigir responsabilidade, transparência e coerência na aplicação de cada centavo.
Seja acolhida ou arquivada, a denúncia já cumpre um papel: o de chamar a atenção para práticas que, silenciosamente, podem comprometer a integridade da gestão pública e corroer a confiança da sociedade em seus representantes.
Ao fim, o que resta é uma pergunta que não pode mais ser ignorada: quando uma contratação com dinheiro público deixa de ser só técnica — e passa a ser, também, um ato político que exige explicação?