O mundo do cinema e da música perdeu uma de suas figuras mais marcantes. Morreu aos 93 anos, por complicações de pneumonia, o compositor argentino‑americano Lalo Schifrin, criador de algumas das trilhas sonoras mais emblemáticas da história do audiovisual, incluindo o inesquecível tema de Missão Impossível.
A notícia foi confirmada por seus filhos nesta semana, e causou comoção entre músicos, cinéfilos e fãs de trilhas instrumentais em todo o mundo. Com uma carreira que atravessou mais de seis décadas, Schifrin deixou não apenas músicas icônicas, mas também uma assinatura inconfundível de estilo, ousadia e sofisticação musical.
Uma vida guiada pela música desde o início
Nascido em Buenos Aires em 21 de junho de 1932, Schifrin — batizado originalmente de Boris Claudio Schifrin — teve contato com a música desde cedo. Seu pai era violinista da Orquestra Sinfônica do Teatro Colón, e o jovem Lalo cresceu em meio a partituras e ensaios, mergulhando cedo no universo clássico.
Ainda jovem, mudou-se para Paris, onde estudou no conceituado Conservatoire de Paris. Foi lá que começou a desenvolver a habilidade de fundir linguagens musicais distintas — misturando erudição, jazz, ritmos latinos e elementos experimentais de forma que poucos ousavam naquela época.
Nos anos 1950 e 60, Schifrin foi pianista e arranjador da banda de Dizzy Gillespie, uma das maiores lendas do jazz norte-americano. Essa vivência o consolidou como um nome de respeito no meio musical, preparando o terreno para sua transição ao cinema.
O som que moldou o ritmo de um gênero
Lalo Schifrin eternizou-se no imaginário coletivo ao compor o tema de Missão Impossível em 1966. Com seu compasso incomum de 5/4 e pulsação acelerada, a música se tornou símbolo de tensão, estratégia e ação, sendo reconhecida imediatamente por gerações de espectadores ao redor do mundo.
Mas seu legado vai muito além da famosa abertura. Schifrin foi responsável por trilhas memoráveis de filmes como Bullitt (1968), com Steve McQueen, Dirty Harry (1971), estrelado por Clint Eastwood, Cool Hand Luke e tantas outras obras que marcaram o cinema dos anos 60 e 70. Suas composições sabiam dosar silêncio e explosão, criando atmosferas que davam vida às imagens.
Além das telonas, Lalo também marcou presença na televisão, com temas para séries como Mannix e Starsky & Hutch. Com estilo inconfundível, ele transformou as trilhas sonoras em personagens invisíveis, capazes de conduzir a emoção de uma cena sem dizer uma só palavra.
Reconhecimento internacional e legado consagrado
Ao longo de sua carreira, Schifrin foi indicado a seis Oscars, venceu quatro prêmios Grammy e, em 2018, recebeu o Oscar honorário da Academia de Hollywood pelo conjunto da obra. A homenagem foi entregue por ninguém menos que Clint Eastwood, com quem trabalhou em vários filmes e que sempre elogiou sua precisão narrativa através da música.
Seu talento o levou a reger orquestras sinfônicas em todo o mundo e a compor também para teatro, televisão e eventos esportivos. Mesmo nos últimos anos de vida, continuava produzindo e sendo referência para músicos contemporâneos, de Hans Zimmer a Michael Giacchino.
Uma morte sentida mas uma obra que permanece viva
Schifrin morreu rodeado pela família, segundo nota oficial divulgada nesta semana. Apesar da idade avançada e do diagnóstico de pneumonia, o compositor manteve-se lúcido e ativo até pouco antes do agravamento de seu estado de saúde. Deixou esposa, filhos e uma geração inteira de fãs e músicos que o reverenciam.
Para além dos prêmios e da técnica impecável, Lalo Schifrin deixa o exemplo de alguém que soube inovar sem perder a elegância, misturar sem perder a identidade e emocionar sem precisar de palavras. Sua música continua sendo tocada, estudada, reinterpretada e, sobretudo, sentida.
A trilha que nunca termina
Num mundo em que a trilha sonora muitas vezes é vista como pano de fundo, Lalo Schifrin provou que ela também pode ser protagonista. Seus acordes continuam ressoando não apenas nas reprises de Missão Impossível ou nas sessões nostálgicas de Dirty Harry, mas em cada projeto que busca na música o coração de sua narrativa.
A despedida é inevitável, mas o som permanece. E o que Lalo criou seguirá sendo ouvido por muitas gerações — como uma missão cumprida, mas que nunca termina de verdade.