O presidente Donald Trump provocou um abalo sem precedentes na política monetária americana ao ordenar a demissão da diretora do Federal Reserve (Fed), Lisa Cook. A medida inédita foi rejeitada pelo próprio banco central, que defendeu a autonomia da instituição.
A iniciativa reacendeu o debate sobre a independência do Fed, considerada essencial para a estabilidade da maior economia do mundo.
O que motivou a decisão de Trump
Desde o início de seu segundo mandato, em janeiro, Trump tem pressionado publicamente o Federal Reserve a reduzir a taxa de juros, que permanece entre 4,25% e 4,5% desde dezembro de 2024. Em diversas ocasiões, o presidente acusou o Fed de “atrasar” as medidas necessárias para impulsionar o crescimento.
Em junho, Trump chegou a chamar o presidente da instituição, Jerome Powell, de “idiota” e protagonizou um desentendimento em visita à sede do banco, em meio a discussões sobre gastos com reformas no prédio.
Quem é Lisa Cook e por que virou alvo
Lisa Cook, primeira mulher negra a ocupar um dos sete assentos do conselho diretor do Fed, foi nomeada em 2022 pelo então presidente Joe Biden. Trump a acusa de envolvimento em suposta fraude em documentos de financiamento imobiliário. O Departamento de Justiça afirmou que investigará o caso.
Em resposta, Lisa Cook declarou em comunicado: “Não vou renunciar e não há justa causa para a demissão”.
O Fed reforçou que os mandatos de seus conselheiros são vitais para a condução das políticas monetárias e que continuará atuando em conformidade com a lei. Trump, por sua vez, disse que respeitará a decisão do judiciário.
A economista Lisa Cook entrou para a história em 2022 ao ser a primeira mulher negra nomeada para o Conselho de Governadores do Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos.
A indicação feita pelo então presidente Joe Biden marcou um avanço na representatividade da instituição e reconheceu a carreira consolidada da especialista em políticas públicas e desenvolvimento econômico.

Carreira acadêmica e internacional
Lisa Cook é doutora pela Universidade da Califórnia, Berkeley, com passagens pela Universidade de Oxford e pela Universidade Estadual de Michigan, onde lecionou economia e relações internacionais.
Fluente em cinco idiomas, incluindo o russo, a economista também atuou em iniciativas de desenvolvimento internacional, como a reconstrução de Ruanda após o genocídio de 1994.
Segundo ela, a experiência marcou profundamente sua visão de mundo. “Essa experiência me convenceu da enorme responsabilidade que os economistas têm”, afirmou em um vídeo em que destacou a importância de usar dados não tradicionais em suas análises.
Experiência no governo americano
Antes de chegar ao Fed, Lisa Cook integrou o Conselho de Assessores Econômicos do presidente Barack Obama e atuou no Departamento do Tesouro dos EUA. Sua trajetória sempre esteve ligada ao estudo dos efeitos da discriminação sobre a economia americana e ao impacto das recessões sobre as populações mais vulneráveis.
Com mandato previsto até 2038, Cook passou a participar diretamente das decisões do Fed sobre a taxa de juros, instrumento-chave para o controle da inflação e estímulo ao crescimento econômico.
Na época de sua indicação, críticos alertaram que escolhas como a de Lisa Cook poderiam politizar a condução da política monetária em meio a um cenário delicado, marcado pela inflação mais alta em 40 anos e pelo desemprego elevado após a pandemia de Covid-19.
Nos últimos meses, a economista defendeu a manutenção das taxas de juros, em uma postura cautelosa para equilibrar as pressões inflacionárias e garantir a estabilidade econômica.
Repercussão política e econômica
A iniciativa presidencial de Donald Trump de querer demitir Lisa Cook do Fed foi duramente criticada pela oposição. O líder democrata no Senado, Chuck Schumer, afirmou nas redes sociais:
“Esse é apenas o último jogo partidário de Donald Trump para interferir na economia a favor de seus doadores bilionários e às custas dos americanos que trabalham duro”.
Economistas alertam para os impactos no mercado. Segundo Atakan Bakiskan, a confiança dos investidores nos EUA já mostra sinais de queda, refletida na desvalorização do dólar ao longo do ano. “Pode cair ainda mais com as ameaças à independência do Fed”, destacou.
O desafio do Fed em meio à incerteza
A missão do Federal Reserve é equilibrar dois indicadores-chave: inflação e emprego. Em momentos de economia aquecida, o banco eleva os juros para conter preços; em fases de desaceleração, reduz a taxa para estimular o consumo.
Atualmente, os sinais estão confusos. O mercado de trabalho dá indícios de enfraquecimento, e Jerome Powell já sinalizou que o Fed pode avaliar um corte de juros na reunião de setembro.