A Ucrânia indicou que está disposta a renunciar à ambição de ingressar na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) como parte de um compromisso para avançar em um acordo de paz com a Rússia.
A declaração foi feita pelo presidente Volodymyr Zelensky antes de reuniões com enviados dos Estados Unidos e líderes europeus, realizadas em Berlim.
A mudança representa um marco relevante na posição de Kiev, que historicamente defendeu a entrada na aliança militar como forma de proteção contra ataques russos e chegou a incluir esse objetivo em sua Constituição.
Mudança de estratégia e foco em garantias de segurança
Segundo Zelensky, a prioridade passa a ser a obtenção de garantias de segurança juridicamente vinculativas oferecidas por parceiros ocidentais, em substituição à adesão formal à Otan.
“Desde o início, o desejo da Ucrânia era aderir à Otan, pois essas são garantias reais de segurança. Alguns parceiros dos EUA e da Europa não apoiaram essa direção”, disse ele em resposta a perguntas de repórteres em um bate-papo do WhatsApp.
O presidente ucraniano destacou que acordos bilaterais com os Estados Unidos e compromissos de países europeus e aliados internacionais poderiam cumprir esse papel.
“Assim, hoje, as garantias bilaterais de segurança entre a Ucrânia e os EUA, as garantias semelhantes ao Artigo 5 para nós por parte dos EUA e as garantias de segurança de pares europeus, bem como de outros países ? Canadá, Japão ? são uma oportunidade para evitar outra invasão russa”, disse Zelensky.
“E isso já é um compromisso da nossa parte”, disse ele, acrescentando que as garantias de segurança devem ser juridicamente vinculativas.
Exigências russas e contexto do conflito
A possível renúncia à Otan atende a uma das principais exigências do Kremlin desde o início da guerra.
O presidente russo, Vladimir Putin, tem defendido que a Ucrânia abandone formalmente seus planos de adesão à aliança, além de manter neutralidade militar e impedir a presença de tropas da Otan em seu território.
Autoridades russas também defendem um compromisso escrito das potências ocidentais para impedir a expansão da Otan para o leste europeu, o que incluiria outros países do antigo bloco soviético.

Reuniões em Berlim e papel dos Estados Unidos
As declarações de Zelensky ocorrem às vésperas de encontros diplomáticos na capital alemã.
Um funcionário norte-americano afirmou que o enviado do presidente dos EUA, Donald Trump, Steve Witkoff, e seu genro, Jared Kushner, viajaram à Alemanha para participar das conversas com autoridades ucranianas e europeias.
A presença de Witkoff, que liderou negociações anteriores envolvendo uma proposta de paz dos EUA, foi interpretada como um sinal de possível avanço, quase quatro anos após a invasão russa de 2022.
Zelensky informou que Ucrânia, Estados Unidos e países europeus analisam um plano de 20 pontos, que poderá resultar em um cessar-fogo.
Segundo ele, Kiev não mantém negociações diretas com Moscou e avalia que um cessar-fogo ao longo das atuais linhas de frente seria uma opção viável.
Pressão internacional e cenário considerado crítico
Reino Unido, França e Alemanha vêm trabalhando para ajustar propostas apresentadas pelos EUA, que previam, em versões preliminares, concessões territoriais adicionais por parte da Ucrânia, limites às forças armadas e o abandono da aspiração à Otan.
Aliados europeus classificaram o momento como “crítico”, destacando que as decisões em curso podem moldar o futuro do país. Paralelamente, governos europeus discutem o uso de ativos russos congelados para financiar o orçamento militar e civil ucraniano.
Impactos da guerra e declarações recentes
O presidente Volodymyr Zelensky voltou a denunciar ataques russos contra infraestrutura essencial, afirmando que centenas de milhares de pessoas permanecem sem energia elétrica após bombardeios a sistemas de energia, aquecimento e abastecimento de água.
“A Rússia está prolongando a guerra e procura infligir o máximo de danos possível ao nosso povo”, disse ele.
No âmbito da Otan, o secretário-geral Mark Rutte afirmou recentemente que a aliança deve estar preparada para conflitos de grande escala e declarou que “somos o próximo alvo da Rússia”, em discurso realizado em Berlim.
O Kremlin rejeitou as afirmações.
“Esta parece ser uma declaração de um representante de uma geração que conseguiu esquecer como foi realmente a Segunda Guerra Mundial”, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, ao repórter da televisão estatal Pavel Zarubin, neste domingo.
“Eles não têm compreensão, e infelizmente, o Sr. Rutte, ao fazer declarações tão irresponsáveis, simplesmente não entende do que está falando”, acrescentou Peskov.
A guerra iniciada em 2022 segue como o conflito mais mortal em solo europeu desde a Segunda Guerra Mundial, enquanto esforços diplomáticos se intensificam em busca de um possível cessar-fogo.


