Um estudo do sistema de Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar (IPC) revelou que a Cidade de Gaza e regiões próximas vivem oficialmente em situação de fome. Segundo o levantamento, cerca de 514 mil palestinos, quase um quarto da população local, enfrentam escassez extrema de alimentos, com projeções de que o número chegue a 641 mil até o final de setembro.
A análise também mostra que 280 mil pessoas estão concentradas no norte do território, incluindo a Cidade de Gaza, já considerada em situação de fome — a primeira vez que o IPC faz essa classificação na região. As demais estão em Deir al-Balah e Khan Younis, no centro e sul, onde a fome deve se intensificar nos próximos meses.
Reação de Netanyahu
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, rejeitou o relatório em comunicado nesta sexta-feira (22).
“O relatório do IPC é uma mentira absoluta. Israel não tem uma política de fome. Israel tem uma política de prevenção da fome. Desde o início da guerra, Israel permitiu que 2 milhões de toneladas de ajuda entrassem na Faixa de Gaza, mais de uma tonelada de ajuda por pessoa”, afirmou.
Segundo Netanyahu, o documento ignora as recentes medidas humanitárias adotadas por Israel.

Condições para classificar a fome
Para que uma área seja oficialmente considerada em situação de fome, o IPC estabelece critérios rigorosos:
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Pelo menos 20% da população precisa enfrentar escassez extrema de alimentos;
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1 em cada 3 crianças deve estar gravemente desnutrida;
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2 a cada 10 mil pessoas devem morrer diariamente por fome, desnutrição ou doenças relacionadas.
Mesmo quando esses números não são atingidos, o órgão pode reconhecer que famílias locais vivem em condições de “inanição, miséria e morte”.
ONU alerta para crime de guerra
O alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, afirmou que a situação em Gaza é resultado direto das ações do governo israelense.
Türk destacou que mortes por inanição podem ser consideradas crimes de guerra. O secretário-geral da ONU, António Guterres, também já havia alertado para uma “catástrofe humanitária épica” na região. A Faixa de Gaza tem aproximadamente 41 km de extensão e até 12 km de largura. Cm uma área de 365 km², abriga mais de 2 milhões de habitantes.
Nesta sexta-feira (22), Tom Fletcher, diplomata britânico que é Subsecretário-Geral das Nações Unidas para Assuntos Humanitários e Coordenador de Socorro de Emergência, fez uma forte declaração sobre o que vem acontecendo em Gaza.
Segundo ele, a situação de miséria extrema e falta de acesso a alimentos atinge os mais vulneráveis primeiro, cada um com um nome, cada um com uma história.
“Isso tira das pessoas a dignidade antes de tirar-lhes a vida. Os pais precisam escolher qual filho vão alimentar. Isso força as pessoas a arriscarem a vida para buscar comida. É uma fome sobre a qual alertamos repetidamente. Mas a mídia internacional não pode entrar para cobrir, para testemunhar.
É fome em 2025. Fome no século 21 observada por drones e as mais avançadas tecnologias militares da história. É uma fome promovida abertamente por alguns líderes israelenses como uma arma de guerra. É uma fome que todos nós assistimos (…) A fome de Gaza é a fome do mundo!”, afirmou o Subsecretário.
Confira a fala de Tom Fletcher:
“It is a famine. The Gaza Famine.
It is a famine that we could have prevented, if we had been allowed. Yet food stacks up at borders because of systematic obstruction by Israel.
Everyone owns this. The #GazaFamine is the world’s famine.”
– @UNReliefChief pic.twitter.com/zvfplQPQqU
— United Nations Geneva (@UNGeneva) August 22, 2025
Repercussão internacional
Diversos países, como Reino Unido, Canadá, Austrália e membros da União Europeia, classificaram a crise como de “níveis inimagináveis” após quase dois anos de conflito entre Israel e o grupo palestino Hamas.
No mês passado, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, declarou que “muitas pessoas estavam morrendo de fome” em Gaza. A fala gerou atrito dentro do Partido Republicano, já que parte da legenda apoia a posição de Netanyahu de que não há fome na região.