Um novo relatório da Global Witness, organização internacional de defesa dos direitos humanos, revelou que o algoritmo do TikTok estaria recomendando conteúdos sexualizados e até pornográficos para perfis de crianças. A investigação acendeu o alerta sobre a eficácia dos mecanismos de segurança da plataforma.
Pesquisadores da entidade criaram quatro contas falsas com idade declarada de 13 anos, entre julho e agosto deste ano. Mesmo com o modo restrito ativado (recurso que, segundo o TikTok, limita o acesso a temas adultos), as contas receberam sugestões de busca com termos sexualmente explícitos e acesso a vídeos com imagens de penetração e nudez.
Conteúdo sexual em contas infantis
As recomendações surgiram na seção “você pode gostar”, onde o aplicativo indica vídeos com base no comportamento do usuário.
De acordo com a Global Witness, apareceram vídeos de mulheres simulando masturbação, exibindo lingerie em locais públicos e até filmes pornográficos disfarçados em conteúdos aparentemente inofensivos.
A pesquisadora Ava Lee, da Global Witness, classificou as descobertas como “um grande choque”.
Segundo ela, “o TikTok não está apenas falhando em impedir que crianças acessem conteúdo inapropriado — ele está sugerindo isso a elas assim que criam uma conta”.
Resposta do TikTok
Em nota, o TikTok afirmou estar “totalmente comprometido a oferecer experiências seguras e adequadas à idade”.
A empresa disse ter mais de 50 recursos voltados à proteção de menores e garantiu que 9 em cada 10 vídeos que violam as diretrizes são removidos antes de serem visualizados.
A plataforma declarou ainda que, após ser informada pela Global Witness, removeu o conteúdo inadequado e implementou melhorias no sistema de sugestão de buscas.
Apesar disso, uma nova rodada de testes realizada pela organização voltou a identificar conteúdos sexuais sendo sugeridos a contas de adolescentes.
Regulamentações e novas leis no Reino Unido
O relatório surge em meio à entrada em vigor dos Códigos Infantis da Lei de Segurança Online (Online Safety Act’s Children’s Codes) no Reino Unido, em julho deste ano.
A legislação obriga plataformas digitais a verificar a idade dos usuários e proteger crianças contra conteúdos nocivos, sob pena de multas de até 18 milhões de libras (R$ 118 milhões) ou 10% da receita global.
A Ofcom, agência reguladora britânica, é responsável por fiscalizar as medidas. As plataformas que descumprirem as regras podem até ser retiradas do ar no país.
Entidades como a Fundação Molly Rose e a Sociedade Nacional para a Prevenção da Crueldade contra Crianças (NSPCC), entretanto, criticam o alcance da lei, argumentando que a criptografia de ponta a ponta ainda impede o controle de conteúdos em aplicativos de mensagens privadas.
Por outro lado, grupos de defesa da privacidade, como a Big Brother Watch, alertam que os mecanismos de verificação podem resultar em “violações de segurança e exclusão digital”.

Situação no Brasil
No Brasil, o TikTok é uma das redes sociais mais populares, presente em 46% dos celulares, segundo pesquisa Mobile Time/Opinion Box.
Em setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o Estatuto Digital da Criança e do Adolescente (ECA Digital), que estabelece a responsabilidade legal das empresas de tecnologia na proteção de menores de 18 anos.
“É um equívoco acreditar que as big techs tomarão a iniciativa de se autorregular. Esse equívoco já custou a vida de várias crianças e adolescentes”, declarou Lula durante a sanção da lei.
A fiscalização caberá à Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), responsável por garantir o cumprimento das normas.
Contexto global
A denúncia da Global Witness se soma a outras investigações recentes. Em março de 2025, uma reportagem da ‘BBC’ revelou que o TikTok lucra com transmissões ao vivo de conteúdo sexual feito por adolescentes, retendo cerca de 70% dos valores pagos.
Segundo ação judicial movida pelo Estado de Utah (EUA), a empresa teria ignorado alertas internos sobre a exploração sexual de menores em 2022. O TikTok afirmou que a acusação “desconsidera as medidas proativas” adotadas para garantir segurança na plataforma.
As revelações da Global Witness reacendem o debate sobre o papel das redes sociais na proteção de menores e o alcance das novas legislações digitais.
À medida que governos reforçam as regras e empresas tentam ajustar seus algoritmos, especialistas alertam: o desafio de equilibrar liberdade digital e segurança infantil permanece mais urgente do que nunca.